A TEIA DA VIDA - Fritjof Capra
“O vácuo quântico, de fato, é a origem do Universo. Esse vácuo quântico é de âmbito misterioso. Nada há nele; ele nada possui, mas é um âmbito generativo” (SOPHIA 1:20).
Brian Swimme
Matemático e cosmólogo
“Nada é tudo; escuridão é luz; sofrimento é alegria. Como é difícil dizer isto, a menos que se tenha feito sua experiência” 44:66.
Padre William Johnston
Jesuíta
A
palavra grega para o grande vazio original, antes da criação, é "Kaos".
Esse "Kaos" (grande vazio ou grande plenitude) criou o "Kosmos"
(aparência, véu) 62:38. Para os gregos, "Kosmos" tem o mesmo sentido que
o termo hindu Maya (ilusão ou Makyo japonês). Ambos os termos
demonstram que a Criação é uma grande ilusão oculta sobre o véu da
materialidade, que se originou de um Vazio Primordial. A filosofia
taoísta chama de Wu-chi (O Sem Cume) a esse Vazio Primordial (Cf.
"CAOS").
Outro conceito importante é que ao vazio (Kaos), o “Nada” que originou “Tudo”, retornará novamente toda a Criação: o “Nada” originou “Tudo” que, por sua vez, retornará ao “Nada”. Esse vazio (shunya) é um importante conceito budista, uma meta a ser alcançada. No Volume 1 dissemos que Michio Kaku, Paul Steinhardt e Andrei Linde defendem a tese de que antes do Big-Bang haveria um estado de efervescência, destituído de matéria, espaço ou tempo, onde periodicamente, nascidos desse “Nada”, surgiriam Universos. Mas como o “Nada” pode dar origem a alguma coisa?
Parte desse mistério começou a ser explicado pela ciência, pelo físico Alan Guth do MIT (Instituto de Tecnologia de Massachussets). Deve-se aqui esclarecer que para a física o “Nada”, ou o vazio, sempre é alguma coisa, embora destituída de matéria. Segundo ele, naquele “Nada” existente antes do Big-Bang, haveria apenas energia de altíssima freqüência. Sabe-se hoje, a partir da mecânica quântica, que energia pode ser convertida em matéria a partir de súbitas variações do campo elétrico (flutuação de vácuo). Então, provavelmente, a partir dessa flutuação ocorreu um colapso da onda energética e as primeiras subpartículas surgiram. Esse colapso teria gerado uma força gravitacional negativa que obrigaria, pela lei de conservação de energia, à formação de matéria na forma de uma imensa massa de quarks: “a energia positiva da matéria foi equilibrada pela energia negativa do campo gravitacional”.
Mas sobre a origem dessa energia primordial e sobre as causas dessa flutuação de vácuo e do colapso de onda, uma grande interrogação continua. Andrei Linde chega a afirmar que uma teoria nunca será completa se não admitir a existência de uma Consciência Superior como responsável pela construção do Universo. Voltamos novamente à noção filosófica do ESPÍRITO que no início é o NADA, mas ao mesmo tempo é o TODO, pois contém, Nele mesmo, TUDO.
Mas para entrar em contato com esse vazio não é necessário “retornar no tempo”. Para a física ele está em toda a parte. Encontramos o vazio no mundo subatômico quando analisamos a constituição do átomo e vemos que ele é um vazio que contém subpartículas. Podemos sentir isso se nos colocarmos dentro do átomo e imaginarmos que ele é apenas poeira, girando numa órbita do tamanho da nave da catedral de São Pedro, em Roma, e cujo centro é um grão de areia. Assim vemos a dimensão do vazio existente dentro de um só átomo. Se toda as subpartículas, presentes em um corpo físico humano, fossem aglutinadas, eliminando-se todo o espaço vazio entre elas, o corpo físico humano seria do tamanho de um grão de areia.
Assim, o moderno conceito de subpartícula não mais pode ser comparado a um grão de poeira, pois se comporta mais como um campo vibratório que pode assumir tanto a forma de quanta (luz) como a de subpartícula (a “poeira”), o campo “quantizado”. Criou-se a “teoria quântica dos campos”, em que cada partícula é um campo distinto, o qual passa a ser a entidade física fundamental. Esse campo, também chamado de vácuo físico, seria um meio contínuo, presente em todos os pontos do espaço. Nele as partículas não passariam de condensações energéticas locais desse campo (o qual, por si só, já é altamente energizado), que surgem e somem, dando a ilusão de uma existência independente, mas mantém contínua interação com os campos vizinhos. Matéria nada mais é que energia congelada.
“Podemos então considerar a matéria como constituída por regiões do espaço nas quais o campo é extremamente intenso... [Então] o campo é a única realidade” 14:160.
Albert Einstein (1.879-1.955)
Dessa forma o vazio quântico da teoria dos campos não é um simples estado de “nada”, mas contém potencial de surgimento de todas as subpartículas como manifestações transitórias desse vazio subjacente. O vazio dos físicos é um vazio que “pulsa num ritmo sem fim de criação e destruição”, uma entidade altamente dinâmica. Mas será que existe nesse espaço “vazio” algo que ainda não conseguimos medir? Quantas outras manifestações não mensuráveis, pelo menos por enquanto, ocorrem nesse “vazio”, paralelamente ao surgimento e desaparecimento das subpartículas. Pode-se antever, então, a comprovação do que a matemática já viu: a existência de até 11 dimensões em nosso Universo (as p-branas vistas no Volume 1), sustentadas pela teoria das supercordas.
De acordo com essa teoria de campo da matéria, a realidade subjacente à subpartícula está além da forma. À ilusão da forma, a filosofia hindu chama Maya, e à noção do vazio, que ao mesmo tempo é vida e origem do Universo, deram o nome de Brahman. Para o hinduísmo Brahman se tornou o mundo através de sua Maya (mágica ou ilusão). Esse mundo “ilusório” seria como uma grande brincadeira, a lila ou cosmodrama, em que todos agiriam movidos pela Lei de Causa e Efeito (Karma), a qual dá a forma cíclica e fluida da existência.
O Sefer Ha-Zohar (Livro do esplendor) cabalista judeu diz que a Divindade suprema é a base e a origem de todas as coisas, em todos os quatro mundos manifestados (Cf. no Volume 1). Ele é visto como o “Nada”, como Existência Negativa, um “ilimitado abismo de glória”.
A eletrodinâmica quântica já estuda as relações dos campos eletromagnéticos com os campos quânticos. Albert Einstein (1.879-1.955) passou os últimos anos de sua vida à busca da relação entre o campo eletromagnético, o campo gravitacional e o “campo quantizado” na sua teoria de um campo unificado 14:161.
Quando a física chegar à definição do campo unificado, como a explicação e a essência de todos os fenômenos do Universo, com potencial criativo infinito, teremos chegado à noção do Brahman hindu que é o mesmo Tao chinês, o mesmo Dharmakaya budista e o mesmo Fohat tibetano, o Senhor e única fonte do Universo 14:161 (Cf. em DEUS, O TODO; no Volume 1), ou teremos chegado apenas à compreensão de uma das manifestações Dele, no nosso Assiah (Mundo da Matéria dos cabalistas):
“O Tao do Céu é vazio e sem forma” 14:161.
Kuan Tsé (VII a.C.)
Desse modo, é do vazio físico que todas as manifestações surgem e é nele que todas desaparecem. Duas maneiras de existir, uma ativa e uma passiva. Forma é vazio e vazio é forma. Por serem manifestações transitórias do vácuo, nada manifestado pode ser considerado individual. Esse tipo de energia existente no vácuo, que ora se dispersa e ora se condensa, a que os físicos chamam de campo quantizado, os chineses chamam de Ch’i. O significado literal de Ch’i manifesta conceitos de “éter” ou “gás”. Dessa forma podemos correlacioná-lo com o sopro vital bíblico que anima o homem, o fluido universal de Allan Kardec (1.804-1.869), o ki japonês ou o Prana hindu, presente em todo o espaço e “animando” todas as formas visíveis transitórias. Será que o conceito de “ser vivo” e “ser não-vivo” se correlacionaria com a quantidade de Ch’i, ou energia de campo quântica presente na forma manifestada?
“O Grande Vácuo [Wu Chi] não pode consistir senão de Ch’i; este Ch’i não pode condensar-se senão para formar todas as coisas e essas coisas não podem senão dispersar-se de modo a formar o Grande Vácuo”14:163.
Chuang Tsé (IV a.C.)
“Forma é vazio, vazio é na verdade forma. Vazio não difere da forma, a forma não difere do vazio. O que é forma é vazio; o que é vazio é forma” 14:164.
Prajna-paramita-hridaya sutra – escola budista Mahayana
Os budistas entraram de forma profunda no conceito de “vazio” (shunya). Buda, no seu Sutra da Sabedoria e Perfeição, deu seus ensinamentos acerca dele. A interpretação desses ensinamentos tem diferenças, de acordo com a escola de pensamento filosófico. Por exemplo, para a escola Madhyamika, entender o vazio significa entender que nenhum fenômeno observável pode ter uma existência inerente e tudo o que existe não tem existência independente, ou seja, todos os fenômenos e objetos são ilusórios e irreais. Em outras palavras o real (vazio) é tudo aquilo que é independente, que existe por si mesmo, do contrário é irreal, dependente e ilusório.
Entrar no vazio seria vivenciar a natureza real subjacente de todos os fenômenos, experimentar o Silêncio. Então o “vazio” não é um vazio, mas está “cheio” com algo (alguma forma de energia vibratória) que preenche essa realidade. A natureza final das coisas seria, então, esse “nada”. Para essa escola budista, essa é a Verdade final, em contraste com a verdade convencional que afirma que as pessoas e as coisas existem independentemente. O Zen tem como meta a busca desse “vácuo”, dessa paz, desse “abismo de glória”, experimentar mentalmente esse vazio: um estado ampliado de consciência. Se o vazio é a realidade e o presente idem, como visto anteriormente, vivenciar e sentir o presente é penetrar no vazio, ou ao inverso, penetrar o vazio é vivenciar e sentir conscientemente esse eterno presente.
Os místicos católicos, bem como de todas as tradições, falam de vazio, escuridão, vácuo e nada, palavras que sugerem total negatividade, mas os descrevem com um colorido todo especial de alegria, beleza e riqueza. Mestre Eckhard (1.260-1.328), monge dominicano, o chama de Treva Divina superessencial (SOPHIA 1:20). O Vazio é o Silêncio onde a Palavra de Deus vibra e mantém o Universo ilusório.
“Uma palavra disse o Pai, que foi seu Filho [o Verbo] e esta Palavra o Pai a diz no eterno silêncio e em silêncio é preciso que pela alma ela seja ouvida” 87:18.
São João da Cruz (1.540-1.591)
“Se não fosse a Sua presença sustentadora, todas as coisas cessariam de existir e cairiam no Nada” 12:44
Madre Teresa de Calcutá (1.910-1.997)
É possível pensar que o vazio existe, mas, segundo o XIV Dalai Lama, o próprio vazio não tem existência independente. O vazio também depende de alguma coisa, pois é um aspecto de todas as coisas observadas. Dessa forma, se o vazio não tem existência independente, ele não é real e existe um vazio do vazio que teríamos que perceber 28:164. Se continuarmos esse raciocínio indefinidamente, poderemos inferir que a Verdade final é a ausência de uma natureza absoluta independente 28:166.
Podemos usar uma metáfora intelectual para se ter uma idéia dessa outra dimensão da existência, onde todas as coisas estão interligadas, da qual não temos consciência. Pense que você é uma pequena gota, da superfície de um imenso oceano. Enquanto na superfície, você vivencia todas as tormentas a que essa superfície está sujeita: torra de calor quando ao sol, congela de frio com os ventos noturnos, é jogado de um lado para o outro, ao sabor das tormentas que lhe atingem, e a todos os seus amigos da superfície, e se resigna a essa sua sorte como a única realidade existente. Mas um colega seu, por acaso, numa dessas tormentas foi jogado um pouco para o fundo e teve um vislumbre de uma dimensão em que uma profunda paz é a realidade e conclui que a superfície é apenas uma ilusão. Esse seu amigo passa a viver aquela paz, se torna uma “gota estranha” no mundo da superfície, a quem nenhuma atribulação da superfície atinge ou a torna infeliz. Assim, ela conta a uma outra gotinha o que observou no lapso de tempo em que esteve submerso. Essa gotinha, por seu próprio esforço e após anos de tentativas, consegue submergir e comprova, por si mesmo, que aquela realidade existe de fato, e dá o seu testemunho ao reino das gotinhas. Mas você não acredita, simplesmente porque a quase totalidade das gotas da superfície não relata o mesmo e porque você mesmo nunca experimentou essa realidade. Você as chama de malucas ou místicas.
O oceano é o vazio físico e religioso, um “nada” cheio de “tudo”. Aquelas gotas tiveram um vislumbre mental do “vazio”, ou em outras palavras, tiveram uma experiência mística. Na linguagem das religiões: o pangree africano, o Samadhi hindu, o Sanmai (grande fixação) zen-budista, o nirvana ou jhana budista, o Daat judeu hassídico, o êxtase contemplativo cristão (contemplação infusa), o fana muçulmano, a percepção transcendental da meditação transcendental, a turiya da kundalini-yoga, a superconsciência de Sri Aurobindo (1.872-1.950) e de Paramahansa Yogananda (1.893-1.952), a Grande Imobilidade dos taoístas, etc.. Enfim, como gota, a sua individualidade dura o exato lapso de tempo em que você salta da superfície, após o que você novamente é incorporado ao oceano.
A existência é, então, uma grande teia cósmica energética em que tudo o que pode ser chamado de individualidade está, de alguma forma, separado do Real (do Vazio) e que falar de Vida só faz sentido quando se tem em mente a unidade de todas as coisas na Grande Teia Cósmica da Vida Una. Toda individualidade é impermanente e ilusória.
Outro conceito importante é que ao vazio (Kaos), o “Nada” que originou “Tudo”, retornará novamente toda a Criação: o “Nada” originou “Tudo” que, por sua vez, retornará ao “Nada”. Esse vazio (shunya) é um importante conceito budista, uma meta a ser alcançada. No Volume 1 dissemos que Michio Kaku, Paul Steinhardt e Andrei Linde defendem a tese de que antes do Big-Bang haveria um estado de efervescência, destituído de matéria, espaço ou tempo, onde periodicamente, nascidos desse “Nada”, surgiriam Universos. Mas como o “Nada” pode dar origem a alguma coisa?
Parte desse mistério começou a ser explicado pela ciência, pelo físico Alan Guth do MIT (Instituto de Tecnologia de Massachussets). Deve-se aqui esclarecer que para a física o “Nada”, ou o vazio, sempre é alguma coisa, embora destituída de matéria. Segundo ele, naquele “Nada” existente antes do Big-Bang, haveria apenas energia de altíssima freqüência. Sabe-se hoje, a partir da mecânica quântica, que energia pode ser convertida em matéria a partir de súbitas variações do campo elétrico (flutuação de vácuo). Então, provavelmente, a partir dessa flutuação ocorreu um colapso da onda energética e as primeiras subpartículas surgiram. Esse colapso teria gerado uma força gravitacional negativa que obrigaria, pela lei de conservação de energia, à formação de matéria na forma de uma imensa massa de quarks: “a energia positiva da matéria foi equilibrada pela energia negativa do campo gravitacional”.
Mas sobre a origem dessa energia primordial e sobre as causas dessa flutuação de vácuo e do colapso de onda, uma grande interrogação continua. Andrei Linde chega a afirmar que uma teoria nunca será completa se não admitir a existência de uma Consciência Superior como responsável pela construção do Universo. Voltamos novamente à noção filosófica do ESPÍRITO que no início é o NADA, mas ao mesmo tempo é o TODO, pois contém, Nele mesmo, TUDO.
Mas para entrar em contato com esse vazio não é necessário “retornar no tempo”. Para a física ele está em toda a parte. Encontramos o vazio no mundo subatômico quando analisamos a constituição do átomo e vemos que ele é um vazio que contém subpartículas. Podemos sentir isso se nos colocarmos dentro do átomo e imaginarmos que ele é apenas poeira, girando numa órbita do tamanho da nave da catedral de São Pedro, em Roma, e cujo centro é um grão de areia. Assim vemos a dimensão do vazio existente dentro de um só átomo. Se toda as subpartículas, presentes em um corpo físico humano, fossem aglutinadas, eliminando-se todo o espaço vazio entre elas, o corpo físico humano seria do tamanho de um grão de areia.
Assim, o moderno conceito de subpartícula não mais pode ser comparado a um grão de poeira, pois se comporta mais como um campo vibratório que pode assumir tanto a forma de quanta (luz) como a de subpartícula (a “poeira”), o campo “quantizado”. Criou-se a “teoria quântica dos campos”, em que cada partícula é um campo distinto, o qual passa a ser a entidade física fundamental. Esse campo, também chamado de vácuo físico, seria um meio contínuo, presente em todos os pontos do espaço. Nele as partículas não passariam de condensações energéticas locais desse campo (o qual, por si só, já é altamente energizado), que surgem e somem, dando a ilusão de uma existência independente, mas mantém contínua interação com os campos vizinhos. Matéria nada mais é que energia congelada.
“Podemos então considerar a matéria como constituída por regiões do espaço nas quais o campo é extremamente intenso... [Então] o campo é a única realidade” 14:160.
Albert Einstein (1.879-1.955)
Dessa forma o vazio quântico da teoria dos campos não é um simples estado de “nada”, mas contém potencial de surgimento de todas as subpartículas como manifestações transitórias desse vazio subjacente. O vazio dos físicos é um vazio que “pulsa num ritmo sem fim de criação e destruição”, uma entidade altamente dinâmica. Mas será que existe nesse espaço “vazio” algo que ainda não conseguimos medir? Quantas outras manifestações não mensuráveis, pelo menos por enquanto, ocorrem nesse “vazio”, paralelamente ao surgimento e desaparecimento das subpartículas. Pode-se antever, então, a comprovação do que a matemática já viu: a existência de até 11 dimensões em nosso Universo (as p-branas vistas no Volume 1), sustentadas pela teoria das supercordas.
De acordo com essa teoria de campo da matéria, a realidade subjacente à subpartícula está além da forma. À ilusão da forma, a filosofia hindu chama Maya, e à noção do vazio, que ao mesmo tempo é vida e origem do Universo, deram o nome de Brahman. Para o hinduísmo Brahman se tornou o mundo através de sua Maya (mágica ou ilusão). Esse mundo “ilusório” seria como uma grande brincadeira, a lila ou cosmodrama, em que todos agiriam movidos pela Lei de Causa e Efeito (Karma), a qual dá a forma cíclica e fluida da existência.
O Sefer Ha-Zohar (Livro do esplendor) cabalista judeu diz que a Divindade suprema é a base e a origem de todas as coisas, em todos os quatro mundos manifestados (Cf. no Volume 1). Ele é visto como o “Nada”, como Existência Negativa, um “ilimitado abismo de glória”.
A eletrodinâmica quântica já estuda as relações dos campos eletromagnéticos com os campos quânticos. Albert Einstein (1.879-1.955) passou os últimos anos de sua vida à busca da relação entre o campo eletromagnético, o campo gravitacional e o “campo quantizado” na sua teoria de um campo unificado 14:161.
Quando a física chegar à definição do campo unificado, como a explicação e a essência de todos os fenômenos do Universo, com potencial criativo infinito, teremos chegado à noção do Brahman hindu que é o mesmo Tao chinês, o mesmo Dharmakaya budista e o mesmo Fohat tibetano, o Senhor e única fonte do Universo 14:161 (Cf. em DEUS, O TODO; no Volume 1), ou teremos chegado apenas à compreensão de uma das manifestações Dele, no nosso Assiah (Mundo da Matéria dos cabalistas):
“O Tao do Céu é vazio e sem forma” 14:161.
Kuan Tsé (VII a.C.)
Desse modo, é do vazio físico que todas as manifestações surgem e é nele que todas desaparecem. Duas maneiras de existir, uma ativa e uma passiva. Forma é vazio e vazio é forma. Por serem manifestações transitórias do vácuo, nada manifestado pode ser considerado individual. Esse tipo de energia existente no vácuo, que ora se dispersa e ora se condensa, a que os físicos chamam de campo quantizado, os chineses chamam de Ch’i. O significado literal de Ch’i manifesta conceitos de “éter” ou “gás”. Dessa forma podemos correlacioná-lo com o sopro vital bíblico que anima o homem, o fluido universal de Allan Kardec (1.804-1.869), o ki japonês ou o Prana hindu, presente em todo o espaço e “animando” todas as formas visíveis transitórias. Será que o conceito de “ser vivo” e “ser não-vivo” se correlacionaria com a quantidade de Ch’i, ou energia de campo quântica presente na forma manifestada?
“O Grande Vácuo [Wu Chi] não pode consistir senão de Ch’i; este Ch’i não pode condensar-se senão para formar todas as coisas e essas coisas não podem senão dispersar-se de modo a formar o Grande Vácuo”14:163.
Chuang Tsé (IV a.C.)
“Forma é vazio, vazio é na verdade forma. Vazio não difere da forma, a forma não difere do vazio. O que é forma é vazio; o que é vazio é forma” 14:164.
Prajna-paramita-hridaya sutra – escola budista Mahayana
Os budistas entraram de forma profunda no conceito de “vazio” (shunya). Buda, no seu Sutra da Sabedoria e Perfeição, deu seus ensinamentos acerca dele. A interpretação desses ensinamentos tem diferenças, de acordo com a escola de pensamento filosófico. Por exemplo, para a escola Madhyamika, entender o vazio significa entender que nenhum fenômeno observável pode ter uma existência inerente e tudo o que existe não tem existência independente, ou seja, todos os fenômenos e objetos são ilusórios e irreais. Em outras palavras o real (vazio) é tudo aquilo que é independente, que existe por si mesmo, do contrário é irreal, dependente e ilusório.
Entrar no vazio seria vivenciar a natureza real subjacente de todos os fenômenos, experimentar o Silêncio. Então o “vazio” não é um vazio, mas está “cheio” com algo (alguma forma de energia vibratória) que preenche essa realidade. A natureza final das coisas seria, então, esse “nada”. Para essa escola budista, essa é a Verdade final, em contraste com a verdade convencional que afirma que as pessoas e as coisas existem independentemente. O Zen tem como meta a busca desse “vácuo”, dessa paz, desse “abismo de glória”, experimentar mentalmente esse vazio: um estado ampliado de consciência. Se o vazio é a realidade e o presente idem, como visto anteriormente, vivenciar e sentir o presente é penetrar no vazio, ou ao inverso, penetrar o vazio é vivenciar e sentir conscientemente esse eterno presente.
Os místicos católicos, bem como de todas as tradições, falam de vazio, escuridão, vácuo e nada, palavras que sugerem total negatividade, mas os descrevem com um colorido todo especial de alegria, beleza e riqueza. Mestre Eckhard (1.260-1.328), monge dominicano, o chama de Treva Divina superessencial (SOPHIA 1:20). O Vazio é o Silêncio onde a Palavra de Deus vibra e mantém o Universo ilusório.
“Uma palavra disse o Pai, que foi seu Filho [o Verbo] e esta Palavra o Pai a diz no eterno silêncio e em silêncio é preciso que pela alma ela seja ouvida” 87:18.
São João da Cruz (1.540-1.591)
“Se não fosse a Sua presença sustentadora, todas as coisas cessariam de existir e cairiam no Nada” 12:44
Madre Teresa de Calcutá (1.910-1.997)
É possível pensar que o vazio existe, mas, segundo o XIV Dalai Lama, o próprio vazio não tem existência independente. O vazio também depende de alguma coisa, pois é um aspecto de todas as coisas observadas. Dessa forma, se o vazio não tem existência independente, ele não é real e existe um vazio do vazio que teríamos que perceber 28:164. Se continuarmos esse raciocínio indefinidamente, poderemos inferir que a Verdade final é a ausência de uma natureza absoluta independente 28:166.
Podemos usar uma metáfora intelectual para se ter uma idéia dessa outra dimensão da existência, onde todas as coisas estão interligadas, da qual não temos consciência. Pense que você é uma pequena gota, da superfície de um imenso oceano. Enquanto na superfície, você vivencia todas as tormentas a que essa superfície está sujeita: torra de calor quando ao sol, congela de frio com os ventos noturnos, é jogado de um lado para o outro, ao sabor das tormentas que lhe atingem, e a todos os seus amigos da superfície, e se resigna a essa sua sorte como a única realidade existente. Mas um colega seu, por acaso, numa dessas tormentas foi jogado um pouco para o fundo e teve um vislumbre de uma dimensão em que uma profunda paz é a realidade e conclui que a superfície é apenas uma ilusão. Esse seu amigo passa a viver aquela paz, se torna uma “gota estranha” no mundo da superfície, a quem nenhuma atribulação da superfície atinge ou a torna infeliz. Assim, ela conta a uma outra gotinha o que observou no lapso de tempo em que esteve submerso. Essa gotinha, por seu próprio esforço e após anos de tentativas, consegue submergir e comprova, por si mesmo, que aquela realidade existe de fato, e dá o seu testemunho ao reino das gotinhas. Mas você não acredita, simplesmente porque a quase totalidade das gotas da superfície não relata o mesmo e porque você mesmo nunca experimentou essa realidade. Você as chama de malucas ou místicas.
O oceano é o vazio físico e religioso, um “nada” cheio de “tudo”. Aquelas gotas tiveram um vislumbre mental do “vazio”, ou em outras palavras, tiveram uma experiência mística. Na linguagem das religiões: o pangree africano, o Samadhi hindu, o Sanmai (grande fixação) zen-budista, o nirvana ou jhana budista, o Daat judeu hassídico, o êxtase contemplativo cristão (contemplação infusa), o fana muçulmano, a percepção transcendental da meditação transcendental, a turiya da kundalini-yoga, a superconsciência de Sri Aurobindo (1.872-1.950) e de Paramahansa Yogananda (1.893-1.952), a Grande Imobilidade dos taoístas, etc.. Enfim, como gota, a sua individualidade dura o exato lapso de tempo em que você salta da superfície, após o que você novamente é incorporado ao oceano.
A existência é, então, uma grande teia cósmica energética em que tudo o que pode ser chamado de individualidade está, de alguma forma, separado do Real (do Vazio) e que falar de Vida só faz sentido quando se tem em mente a unidade de todas as coisas na Grande Teia Cósmica da Vida Una. Toda individualidade é impermanente e ilusória.
Fiquem com Luz - Ssapyará
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